Lavagem Nasal com Água: Um Guia Completo para uma Prática Segura e Eficaz

Por Mizael Xavier
Lavagem Nasal com Água: Um Guia Completo para uma Prática Segura e Eficaz

Lavagem Nasal com Água: Mitos, Verdades e Recomendações

A lavagem nasal é uma prática milenar, com origens na medicina Ayurveda da Índia, e consiste na irrigação das cavidades nasais. Seu objetivo principal é remover o excesso de muco, secreções, alérgenos, poluentes e outras partículas que podem se acumular no nariz, além de hidratar a mucosa nasal. Embora seja um procedimento simples e geralmente seguro, a questão sobre "pode fazer lavagem nasal com água" gera muitas dúvidas e requer esclarecimentos importantes para garantir seus benefícios e evitar riscos.

Ao longo dos anos, a lavagem nasal tem ganhado popularidade e reconhecimento por seus benefícios na profilaxia e tratamento de diversas condições nasossinusais, como rinites, sinusites e até mesmo no alívio de sintomas gripais. Inclusive, um estudo realizado na Escócia e apresentado no Congresso Anual da Sociedade Respiratória Europeia, demonstrou que o uso de gotas de água salgada no nariz pode diminuir a duração de resfriados em crianças. Pesquisadores da USP, em colaboração com centros de pesquisa internacionais, também utilizaram a lavagem nasal com soro fisiológico em estudos para entender mecanismos associados à pneumonia.

Pode fazer lavagem nasal com água da torneira diretamente?

A resposta direta é: não é recomendado fazer lavagem nasal diretamente com água da torneira sem tratamento prévio. A água da torneira, mesmo que potável e segura para ingestão, não é estéril e pode conter baixos níveis de microrganismos, como bactérias e amebas (a exemplo da Naegleria fowleri e Acanthamoeba). Esses organismos, inofensivos quando ingeridos pois são eliminados pelo ácido estomacal, podem permanecer vivos nas passagens nasais e causar infecções potencialmente graves, incluindo, em casos raros, infecções cerebrais fatais, conforme alertado pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC) dos Estados Unidos.

Além disso, a água pura, sem a adição de sal, pode irritar a delicada mucosa nasal. O fluido nasal natural possui uma leve salinidade e um pH equilibrado; introduzir água pura pode perturbar esse equilíbrio, causando desconforto, ardência e até mesmo uma sensação de queimação. A falta de salinidade na água da torneira é um dos principais motivos para não ser indicada para este procedimento.

Qual tipo de água é seguro para a lavagem nasal?

Para uma lavagem nasal segura e eficaz, a recomendação médica e de órgãos de saúde como o CDC e a Food and Drug Administration (FDA) dos EUA é utilizar:

  • Água destilada ou estéril: Facilmente encontradas em farmácias, são as opções mais seguras por serem livres de impurezas e microrganismos.
  • Água fervida e resfriada: Ferver a água da torneira por 3 a 5 minutos (ou 1 minuto em altitudes normais, estendendo para 3 minutos em elevações acima de 2.000 metros) e deixá-la esfriar até atingir uma temperatura morna ou ambiente também a torna segura para o uso. A água previamente fervida pode ser armazenada em um recipiente limpo e fechado por até 24 horas.
  • Água filtrada: Utilizar um filtro de água com poros de tamanho absoluto de 1 mícron ou menor, projetado para remover organismos potencialmente infecciosos, também é uma opção. No entanto, é importante ressaltar que nem todos os filtros são capazes de eliminar todos os contaminantes, sendo a água destilada ou fervida consideradas mais seguras. Um caso relatado em 2018 demonstrou uma infecção por Balamuthia mandrillaris após o uso de água da torneira filtrada com um filtro comum do tipo Brita, que não foi suficiente para esterilizar a água.

É crucial que a água utilizada esteja em temperatura ambiente ou levemente morna, nunca gelada ou quente demais, para evitar desconforto e choque térmico na mucosa nasal. O uso de soro fisiológico a 0,9%, que possui concentração de sal similar aos fluidos corporais, é a opção mais frequentemente recomendada por profissionais de saúde. Soluções salinas específicas para lavagem nasal, disponíveis em farmácias, também são seguras e eficazes.

Como preparar uma solução salina caseira para lavagem nasal?

Caso não tenha soro fisiológico disponível, é possível preparar uma solução salina caseira. Algumas receitas comuns incluem:

  • Misturar 2 colheres de chá de sal não iodado com 1 colher de chá de bicarbonato de sódio em 240ml (aproximadamente um copo) de água previamente fervida ou destilada.
  • Outra opção mais simples é dissolver 1 colher de chá de sal marinho em cerca de meio litro de água previamente fervida ou destilada, podendo adicionar uma pitada de bicarbonato de sódio.
  • Uma receita mencionada por um otorrinolaringologista sugere 250 ml de água filtrada ou fervida, 1 colher de café rasa de sal de cozinha e 1 colher de café rasa de bicarbonato de sódio.

É fundamental utilizar as proporções corretas para evitar irritação. Uma solução muito concentrada (hipertônica) pode causar desconforto, enquanto uma solução muito diluída (hipotônica) pode não ser eficaz e também irritar a mucosa. Para melhor preservação, recomenda-se manter a solução caseira na geladeira após o preparo. Sempre aqueça levemente a solução antes do uso.

Benefícios da Lavagem Nasal Correta

Quando realizada corretamente com uma solução salina apropriada, a lavagem nasal oferece diversos benefícios:

  • Limpeza e desobstrução: Remove o excesso de muco, crostas, secreções purulentas, alérgenos, poeira, poluentes e outros irritantes das passagens nasais.
  • Alívio de sintomas: Ajuda a aliviar a congestão nasal, coriza, espirros e prurido nasal associados a rinites, sinusites, resfriados, gripes e alergias.
  • Melhora da respiração: Ao desobstruir as vias aéreas, facilita a respiração.
  • Prevenção de infecções: Ao remover patógenos e reduzir o acúmulo de secreções, pode ajudar a prevenir infecções respiratórias como sinusite e otite média.
  • Umidificação da mucosa nasal: Mantém as narinas hidratadas, especialmente em ambientes secos ou durante o uso de ar condicionado.
  • Melhora do olfato: Em alguns casos, pode auxiliar na melhora do olfato.
  • Auxílio na recuperação pós-operatória: Ajuda a limpar as passagens nasais após cirurgias na região.

Como Fazer a Lavagem Nasal Corretamente

Existem diversos dispositivos para realizar a lavagem nasal, como seringas sem agulha (idealmente de 60ml para adultos), lotas (neti pots), garrafinhas compressíveis e sprays de jato contínuo. A escolha do dispositivo pode variar conforme a preferência pessoal e a idade do indivíduo. Empresas como a AGPMED desenvolveram dispositivos lúdicos, como o NoseWash, para facilitar a lavagem nasal em crianças, inclusive com aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do FDA.

O procedimento básico geralmente envolve:

  1. Preparar a solução salina na temperatura adequada (morna).
  2. Inclinar a cabeça sobre uma pia, ligeiramente para um dos lados, de forma que uma narina fique mais elevada que a outra.
  3. Respirar pela boca.
  4. Inserir o bico do dispositivo na narina superior e aplicar a solução suavemente, permitindo que ela flua pela cavidade nasal e saia pela outra narina.
  5. Assoar o nariz suavemente para remover o restante da solução e do muco.
  6. Repetir o processo na outra narina.

A frequência pode variar de 2 a 3 vezes ao dia, ou conforme orientação médica, especialmente em casos de congestão intensa. É importante não aplicar o líquido com força ou rapidez excessiva para evitar desconforto ou a sensação de afogamento, especialmente em crianças. Em pessoas com desvio de septo ou inflamação intensa, o soro pode ter dificuldade em passar para a outra narina.

Precauções e Possíveis Riscos da Lavagem Nasal

Embora geralmente segura, a lavagem nasal pode apresentar riscos se não for feita corretamente:

  • Irritação e desconforto: Pode ocorrer devido à temperatura inadequada da solução, concentração incorreta de sal ou pressão excessiva durante a aplicação.
  • Infecções: O uso de água contaminada ou a falta de higiene adequada do dispositivo pode introduzir microrganismos nas cavidades nasais, aumentando o risco de infecções. É crucial higienizar os dispositivos de lavagem nasal com água e sabão após cada uso e deixá-los secar completamente.
  • Dor de ouvido: Se a solução entrar na tuba auditiva (canal que liga o nariz ao ouvido médio), pode causar dor ou aumentar o risco de otite média, especialmente se a cabeça não estiver na posição correta ou se a pressão for muito forte. Manter a cabeça em posição neutra ou levemente inclinada para frente e falar "AAAA" durante o procedimento (especialmente em crianças) pode ajudar a evitar isso.
  • Sangramento nasal: Pode ocorrer se a pressão for excessiva ou se o bico do dispositivo ferir a mucosa nasal.

Existem algumas contraindicações para a lavagem nasal, como suspeita de corpo estranho nasal, disfagia com risco de aspiração, fissura palatina não corrigida, defeitos na base do crânio e fraturas faciais recentes. Pessoas com sistema imunológico comprometido devem consultar um médico antes de iniciar a prática. A Anvisa, através de pareceres como o Nº 2/2019/SEI/COMEP/Anvisa, trata do enquadramento de produtos para lavagem nasal, visando a regularização sanitária. O Ministério da Saúde também fornece orientações sobre a prática.

Em resumo, pode fazer lavagem nasal com água, desde que seja água devidamente tratada (destilada, estéril ou fervida e resfriada) e, idealmente, transformada em uma solução salina isotônica. Evitar água da torneira diretamente é crucial para a segurança. Seguindo as recomendações corretas, a lavagem nasal é uma ferramenta valiosa para a saúde respiratória. Em caso de dúvidas ou persistência dos sintomas, é fundamental consultar um profissional de saúde, como um otorrinolaringologista.

Mizael Xavier

Mizael Xavier

Desenvolvedor e escritor técnico

Ver todos os posts

Compartilhar: